Conforme noticiou O Globo[1], por determinação do Poder Judiciário de São Paulo, foi cumprida em 10/06 a primeira ordem judicial de busca e apreensão com base na LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais). A investigação busca apurar a suspeita de utilização indevida de dados de clientes por parte de uma corretora de planos de saúde.
Foram alvo de ação sede da empresa e a residência de uma funcionária. Foram recolhidos documentos, computadores e celulares.
Sob o ponto de vista jurídico, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais estabelece entre seus princípios a necessidade de aderência entre o propósito pelo qual determinado dado foi coletado e sua efetiva utilização. Igualmente, a legislação determina que haja compatibilidade do tratamento com as finalidades informadas ao titular, de acordo com o contexto do tratamento, seja em um contrato, seja em um termo de consentimento.
A utilização de um dado para uma nova finalidade não é proibida, nem necessariamente permitida. É preciso identificar todo fluxo do dado (data cycle), identificar suas finalidades e verificar, em cada situação, a legalidade. Dados obtidos para contratação de planos de saúde coletivo correspondem a uma hipótese legítima de tratamento de dados pessoais.
A legislação de planos de saúde permite a coleta de dados pessoais no ato da contratação, por exemplo, para que se possa verificar em um plano de saúde coletivo, se a pessoa física que pretende integrar a relação possui as exigências necessárias. A utilização dos dados pessoais para outras finalidades, no entanto, sujeita-se a uma avaliação específica do propósito, de maneira a identificar, em cada ação, sua adequação e legalidade.
Vale lembrar que há padrões setoriais específicos sobre a governança de dados pessoais na saúde suplementar, de maneira a assegurar a segurança e privacidade. Estas regras dialogam com a LGPD, a qual não afasta a necessidade de um estudo legislativo acerca das normas de proteção de dados, sigilo e confidencialidade aplicáveis em diferentes áreas.
Por fim, a busca e apreensão determinada pelo Judiciário demonstra que há intenção concreta em combater os abusos. Ah, não custa lembrar, a LGPD não se aplica em matéria de persecução criminal, mas as normas de privacidade não impedem o acesso inclusive ao lar, para promover as investigações necessárias.
Gabriel Schulman é Sócio e DPO de Trajano Neto e Paciornik
[1] https://blogs.oglobo.globo.com/lauro-jardim/post/justica-cumpre-primeira-busca-e-apreensao-com-base-na-lgpd.html#:~:text=A%20medida%20foi%20deferida%20pelo,recolhidos%20documentos%2C%20computadores%20e%20celulares.