A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 1.595.832, de relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, ressaltou o entendimento de que não é irrestrita a proteção ao bem de família.
A lei do bem de família já permite a penhora, ou seja, levar o imóvel de alguém a leilão para pagar uma dívida, quando tal débito é originado de empréstimo utilizado para aquisição, reforma ou construção do bem.
No caso em análise a situação é distinta. A Autora havia indicado bem de família como garantia em contrato de mútuo com cláusula de alienação fiduciária, uma modalidade de financiamento por assim dizer.
A Autora afirmou que não poderia ser privada da propriedade de seu único imóvel, reconhecido e protegido como bem de família. Ressaltou ainda que o empréstimo garantido pelo imóvel não era destinado à aquisição ou a construção do imóvel – exceção legal acima mencionada.
Em razão do exposto, discutiu-se no referido julgamento “a validade da pactuação da alienação fiduciária em garantia de imóvel de moradia em contrato de mútuo (cédula de crédito imobiliário), na hipótese em que inexistente qualquer alegação de vício de consentimento do beneficiário da proteção”.
O entendimento da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça foi no sentido de que embora o bem de família seja impenhorável, por força do art. 1º da Lei nº 8.009/1990, não pode o dono renunciar essa proteção por se tratar de questão de ordem pública, porém são permitido atos de disposição do bem, como se vê:
à luz da jurisprudência dominante das Turmas de Direito Privado: (i) a proteção conferida ao bem de família pela Lei 8.009/90 não importa em sua inalienabilidade, revelando-se possível a disposição do imóvel pelo proprietário, inclusive no âmbito de alienação fiduciária; e (ii) a utilização abusiva de tal direito, com evidente violação ao princípio da boa-fé objetiva, não deve ser tolerada, afastando-se o benefício conferido ao titular que exerce o direito em desconformidade com o ordenamento jurídico. (STJ. 4ª Turma. REsp 1.595.832-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 29/10/2019)
Em razão do exposto, concluiu-se que se o proprietário, dotado de capacidade civil, livremente optar por dar seu único imóvel como garantia não poderá, posteriormente, após o inadimplemento da dívida, alegar proteção ao bem de família para invalidar a garantia, contrariando a ética e a boa-fé incidentes em todas as relações negociais.
Bruna de Abreu e Silva
Advogada – Trajano Neto e Paciornik Advogados