Em vigor desde 23/11/2018, lei n. º 13.726/2018, sancionada pelo então Presidente Michel Temer, estabelece que atos e procedimentos administrativos dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios devem ser racionalizados, com o intuito de gerar economia de tempo e dinheiro na relação da população com o Poder Público.

É notório que a burocracia sempre foi uma das características da forma de execução das atividades do poder público no Brasil, pautada por regulamentos, rotinas e hierarquias bem definidas, sendo possível percebê-la no dia a dia daqueles que buscam, por exemplo, se aposentar, abrir uma empresa ou registar documentos em cartório no Brasil, seja pessoa física, seja pessoa jurídica, oportunidade em que é exigida, entre outros, a apresentação de documentos originais e cópia que pode ser autenticada, autenticada com firma reconhecida, por semelhança, por abono e por ai vai.

Salienta-se que a burocratização não demanda apenas tempo, mas também dinheiro, pois o reconhecimento de firma e autenticidade, até então, é atividade exercida exclusivamente pelos tabeliões de notas, conforme prevê o art. 7º, IV, da Lei nº 8.935/94, mediante pagamento de custas.

A lei que passou a vigorar se volta à racionalização dos atos e procedimentos administrativos dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e institui o “Selo de Desburocratização e Simplificação”, com objetivo de suprimir ou simplificar formalidades ou exigências desnecessárias ou superpostas, cujo “custo econômico ou social, tanto para o erário como para o cidadão, seja superior ao eventual risco de fraude”.

Com o advento da nova lei, na relação dos órgãos e entidades dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios com o cidadão, passa a ser dispensada a exigência de: I – reconhecimento de firma; II – autenticação de cópia de documento; III – juntada de documento pessoal do usuário; IV – apresentação de certidão de nascimento; V – apresentação de título de eleitor, exceto para votar ou para registrar candidatura; VI – apresentação de autorização com firma reconhecida para viagem de menor se os pais estiverem presentes no embarque, cabendo ao agente administrativo, detentor de fé pública, confrontar documentos, assinaturas e lavrar sua autenticidade quando necessário.

Passa a ser inexigível, ainda, “prova relativa a fato que já houver sido comprovado pela apresentação de outro documento válido”, o que tende a simplificar a relação do cidadão com o estado, especialmente no que tange à requerimentos administrativos das mais diversas searas, e admissível a comprovação de fatos por meio de declaração escrita e assinada pelo cidadão quando, por motivo não imputável ao solicitante, não for possível obter diretamente do órgão ou entidade responsável documento comprobatório de regularidade que, em caso de declaração falsa, ficará sujeito às sanções administrativas, civis e penais aplicáveis.

Outra importante mudança é a inexigibilidade de certidão ou documento que seja expedido por outro órgão do mesmo poder. Ou seja, não pode uma autarquia do poder executivo, como o INSS por exemplo, exigir do cidadão apresentação de documento que é expedido pela Receita federal, integrante do mesmo poder.

A ideia, ao que parece, é fazer com que órgãos e entidades integrantes do mesmo Poder se comuniquem entre si, num verdadeiro intercâmbio de informações, em benefício do cidadão, que não mais precisará buscar certidões resultantes do cruzamento de informações disponíveis no sistema de dados da mesma esfera de poder público.

Trata-se de interessante inovação a ser adotada pelo funcionalismo público brasileiro, até então engessado em suas práticas, que passa a trabalhar aliado também à tecnologia de comunicação, que passará a ser feita, entre o Poder Público e o cidadão, “por qualquer meio, inclusive comunicação verbal, direta ou telefônica, e correio eletrônico, devendo a circunstância ser registrada quando necessário”.

Acerca do chamado “Selo de Desburocratização e Simplificação”, trata-se de selo destinado ao reconhecimento e estimulação de projetos, programas e práticas que simplifiquem o funcionamento da administração pública e melhorem o atendimento aos usuários dos serviços públicos, e será concedido baseado em critérios como: “I – a racionalização de processos e procedimentos administrativos; II – a eliminação de formalidades desnecessárias ou desproporcionais para as finalidades almejadas; III – os ganhos sociais oriundos da medida de desburocratização; IV – a redução do tempo de espera no atendimento dos serviços públicos; V – a adoção de soluções tecnológicas ou organizacionais que possam ser replicadas em outras esferas da administração pública”.

Como incentivo, os órgãos ou entidades estatais que receberem o Selo de Desburocratização e Simplificação serão inscritos em Cadastro Nacional de Desburocratização, cuja premiação ocorrerá anualmente, à 2 dois órgãos ou entidades, em cada unidade federativa, selecionados com base nos critérios estabelecidos por esta Lei.

Quanto ao servidor público, o incentivo se dará “por meio de sua participação no desenvolvimento e na execução de projetos e programas que resultem na desburocratização do serviço público, que será registrada em seus assentamentos funcionais”.

Resta ponderar, contudo, que por se tratar de lei nova, recém entrada em vigor, não se sabe se os resultados práticos atingirão os objetivos propostos (Desburocratização e Simplificação), competindo aos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios criar grupos setoriais de trabalho com fins de “identificar, nas respectivas áreas, dispositivos legais ou regulamentares que prevejam exigências descabidas ou exageradas ou procedimentos desnecessários ou redundantes; sugerir medidas legais ou regulamentares que visem a eliminar o excesso de burocracia”.

Os efeitos da lei, em vigor desde 23/11/2018, alcançam não apenas pessoas físicas, em que pese conste em seu texto o termo “cidadão”, mas também as pessoas jurídicas que se relacionam com o poder público, conforme entendimento que já permeia o entendimento exarado pelos Tribunais:

Indenizatória – processo extinto por falta de procuração com firma reconhecida – assinatura aposta à procuração semelhante à constante em outros documentos – dispensa de exigência de reconhecimento de firma (lei n.º 13.726/2018, art. 3º inc. I) – sentença anulada – recurso provido. (TJSP – Apelação 1028678-02.2018.8.26.0576 – Relator: Luiz Antônio Costa – Publicação: 17/12/2018).

A ausência de reconhecimento de firma, em princípio, é mera irregularidade formal, passível de ser suprida em certame licitatório em face dos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e da ampla competitividade. Assim, somente quando houver dúvida quanto à autenticidade da assinatura, deve o condutor do procedimento licitatório diligenciar para sanear a falha, pois, quando há o conhecimento de outros documentos que suprem a irregularidade formal, entendo, num primeiro momento, que a inabilitação em face da ausência desta formalidade surge como medida extremada por parte da administração. Destaquei que a Lei Federal nº 13.726/2018, expressamente dispensa a exigência de reconhecimento de firma (…). Assim, quanto à medida cautelar pleiteada, verifiquei o preenchimento dos requisitos autorizadores da sua concessão. (TCE/PR – ACÓRDÂO Nº 1708/19 – RELATOR: CONSELHEIRO FABIO DE SOUZA CAMARGO – Publicação: 03/07/2019)

A nova lei, ao que parece, visa evitar os efeitos que a burocracia exacerbada causa nas relações cidadão/poder público, contribuindo para informalidade e fraudes, e humanizar o serviço público, aproximando o cidadão dos órgãos prestadores de serviços, tendência já observada no ordenamento jurídico brasileiro (Lei 9.784/99; 12.527/2011 e 13.460/2017[1]), cujo resultado – se atingido – tende a ser positivo a todos os envolvidos.

Vanessa Novaes Toda

Advogada – Trajano Neto e Paciornik Advogados