Como amplamente divulgado na imprensa, no dia 13 de maio de 2021, o Supremo Tribunal Federal finalmente deu por encerrada a controvérsia citada por muitos como “tese tributária do século”, ao concluir que o valor do ICMS não poderá integrar a base de cálculo da Contribuição para o PIS e da COFINS.
Tendo em vista a relevância da questão, que abre a oportunidade de recuperação de valores de tributos pagos a maior no passado, é oportuno fazer alguns apontamentos sobre a matéria discutida, bem como acerca da extensão do referido julgado.
A Contribuição para o PIS e a COFINS são contribuições sociais exigidas dos empregadores e das empresas e têm como base de cálculo a receita bruta mensal. Mas o que é receita bruta? As leis que regulam a cobrança das supracitadas contribuições, tanto no regime cumulativo quanto no regime não cumulativo, conceituam receita bruta como soma das receitas obtidas com a venda de bens e serviços (em operações de conta própria ou alheia) e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.
Diante dessa previsão, o Fisco sempre defendeu a ideia de que os valores do ICMS também integrariam o conceito de receita bruta, valendo-se da tese de que o valor do imposto estadual somente poderia ser excluído da base de cálculo das contribuições se a legislação expressamente fizesse tal ressalva.
Os contribuintes, por outro lado, insistiram com firmeza no argumento de que o valor do ICMS apenas ingressa de maneira temporária no caixa da pessoa jurídica, afigurando-se como mero ingresso de soma pertencente a terceiro (governo estadual). Logo, como o imposto estadual não representaria repercussão patrimonial positiva para a pessoa jurídica, não poderá ele integrar o conceito de receita bruta.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado no ano de 2014, chegou a enfrentar o tema e concluiu de maneira favorável aos contribuintes, ocasião em que o relator, Ministro Marco Aurélio, salientou que “o arcabouço jurídico constitucional inviabiliza a tomada de valor alusivo a certo tributo como base de incidência de outro”.
Anos mais tarde, em 2017, a matéria foi novamente analisada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, desta vez em sede de repercussão geral (Tema 69), sendo fixada a seguinte tese: “O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS”.
Inconformada com o resultado, a União houve por bem opor embargos de declaração na tentativa de mudança da posição dos ministros, ressaltando o impacto que a manutenção desse entendimento favorável aos contribuintes poderia causar aos cofres públicos. Por isso, pleiteou a modulação dos efeitos da decisão, para que seja reconhecida a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições somente a partir de 15 de março de 2017, garantindo-se o direito à devolução dos valores pagos a maior nos últimos cinco anos apenas para os contribuintes com demandas judiciais em trâmite até a referida data. Ademais, a esfera de governo passou a sustentar a ideia – que foi paralelamente reproduzida em atos normativos infralegais por ela expedidos – de que o valor do ICMS a ser excluído da base de cálculo das contribuições seria o resultado do imposto apurado mês a mês em conta gráfica (débitos menos créditos), não o valor do imposto destacado nas notas fiscais de saída de mercadorias.
Os embargos de declaração em comento foram julgados no dia 13 de maio passado e os ministros finalmente encerraram a controvérsia que girava em torno da matéria de fundo, esclarecendo que o montante a ser retirado da base cálculo é o relativo ao imposto destacado nas notas fiscais de saída de mercadorias, tese defendida pelos contribuintes, portanto.
Por razões de “segurança jurídica”, no entanto, optaram os ministros pela modulação dos efeitos da decisão, como pleiteado pela União, de maneira que os efeitos da inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo da Contribuição para o PIS e da COFINS retroagem, como regra geral para todos os contribuintes, até a data de 15 de março de 2017, ressalvados os direitos daqueles que tenham ingressado com suas demandas judiciais antes dessa data.
Em sendo assim, as pessoas jurídicas que sejam contribuintes do ICMS estadual e que ainda não ingressaram com demanda judicial sobre a matéria também têm o direito de recuperar o valor da Contribuição para o PIS e da COFINS recolhidas a maior desde 15 de março de 2017, o que pode ser feito inclusive mediante pedido administrativo perante a Receita Federal do Brasil, para fins de compensação das quantias com tributos federais vincendos.
Francisco Bittencourt de Camargo
Advogado – Trajano Neto e Paciornik Advogados